O início do século XV testemunhou um exponencial crescimento nas relações entre o recém criado Império Timúrida da Ásia Central com a Europa Ocidental cristã. Mesmo se auto-proclamando um autentico "ghazi" (guerreiro do Islam), Timur (1336-1405) mantinha relações relativamente amistosas com os "infiéis" e inimizade com basicamente todos os reinos muçulmanos ao seu redor, os quais massacrava sem piedade.
Timur. Reconstrução facial forense por M.Gerasimov | Wikimedia
O líder tártaro-mongol e alguns monarcas europeus tentaram dar início a uma aliança para deter o expansionismo otomano tanto no Ocidente como no Oriente, e se possível varrer o império do mapa. Apesar de os timuridas serem uma dinastia muçulmana desde a conversão de seus ancestrais mongóis ainda no incio do século XIV, uma grande hostilidade ainda existia entre eles e os turcos otomanos bem como em relação aos mamelucos do Egito (que haviam infligido uma grande derrota sobre os mongóis em Ain Jalut, 1260). Após suas campanhas na índia em 1399, Timur tomou Alepo e Damasco dos mamelucos em 1400, campanhas estas que foram extremamente sangrentas, e viram execuções de em massa de populações inteiras, todas elas muçulmanas.
Ele combateu e derrotou o sultão otomano Bayezid I na Batalha de Ancara em 1402, capturando o monarca que posteriormente faleceu no cativeiro em suas mãos. A derrota otomana para os timúridas atrasou a tomada de Constantinopla em mais de 50 anos.
No momento da Batalha de Ancara, dois embaixadores espanhóis já estavam na companhia de Timur: Pelayo de Sotomayor e Fernando de Palazuelos. Estas trocas diplomáticas se assemelhavam à Aliança Franco-Mongol, que ocorreu 100 anos antes, entre Hulago Khan (1218-1265) e potentados europeus.
Timur enviou uma missão diplomática para as cortes europeias de Veneza, Gênova, Londres e Paris, na pessoa do monge dominicano Johannes de Galonifontibus, Arcebispo de Sultaniya, para anunciar sua vitória sobre os otomanos em Ancara. Timur propôs tratados para facilitar o intercambio comercial com o Oriente. Henrique IV da Inglaterra e Carlos VI da França responderam à solicitude do emir tártaro com felicitações.
Johannes chegou a Paris em 15 de junho de 1403. A carta de Timur ao monarca francês descrevia Carlos VI como:
"O mais sereno, mais vitorioso Rei e Sultão, rei dos franceses e de muitas outras nações, amigo do Altíssimo, o próprio monarca benfeitor do mundo, que emergiu triunfante de muitas guerras."
Timur ofereceu uma aliança ofensiva e defensiva a Carlos VI, bem como o desenvolvimento de relações comerciais. Mas o rei da França só conseguiu enviar uma resposta e um embaixador logo antes da morte de Timur (1405).
As relações com a Espanha também foram desenvolvidas. Na visão do historiador espanhol Miguel Ángel Ochoa Brun, as relações entre as cortes de Henrique III de Castela e a de Timur foram o episódio mais importante da diplomacia castelhana medieval. Timur enviou a corte de Castela um embaixador de Chagatay chamado Hajji Muhammad al-Qazi com cartas e presentes.
Em dezembro de 1402, Timur entrou em conflito direto com um pequeno posto avançado europeu na costa da Anatólia. A fortaleza e porto da cidade de Smyrna eram controlados pelos Cavaleiros Hospitalários, que haviam dado escolta e meios de fuga ao príncipe Suleiman, filho de Bayezid I, enquanto este fugia de Timur após a derrota em Ancara. Timur sitiou Smyrna por quinze dias e tomou a cidade, punindo os cavaleiros cristãos que haviam dado asilo e fuga ao príncipe otomano com a morte. Esta ação causou alguma consternação em Aragão e Castela.
Em contrapartida, o rei Henrique III de Castela enviou uma embaixada a corte de Timur em Samarcanda, em 21 de maio de 1403, liderada por Ruy Gonzáles de Clavijo, com dois outros embaixadores, Alfonso Páez e Gómez de Salazar. Em seu retorno em 1406, Timur disse que considerava o rei da Espanha como "seu próprio filho".
Retrato de Ruy González de Clavijo | Wikimedia
De acordo com Clavijo, o bom tratamento de Timur em relação à delegação espanhola contrastava com o desdém demonstrado pelo anfitrião em relação aos enviados do "senhor de Cathay" (o imperador da China ming Zhu Di). O governante chinês, cujo título era "o senhor dos reinos da face da terra", foi chamado por Timur (para consternação de Clavijo), um "ladrão maldoso", e seus embaixadores foram posicionados abaixo dos espanhóis.
A visita de Clavijo a Samarcanda permitiu que ele se reportasse ao público europeu sobre Cathay (China), que poucos europeus puderam visitar diretamente no século que havia decorrido desde as viagens de Marco Polo (1254-1324). Os relatos de Clavijo informam, mesmo que de forma ilegível, sobre a recente guerra civil entre os descendentes do Imperador de Hongwu. Os espanhóis conseguiram falar com alguns dos visitantes chineses e aprenderam sobre as rotas de caravanas entre Samarcanda e Cambalu (Pequim).
Além de contar aos leitores europeus sobre a capital chinesa de Cambalu, que lhe foi dito, "a maior cidade do mundo" e os poderosos exércitos daquele país, Clavijo também - erroneamente - relatou que o novo imperador de Cathay se converteu ao catolicismo. Assim, seu relatório serviu como um dos fatores que apoiavam a crença europeia na presença generalizada do cristianismo em Cathay (China), que continuou a persistir até o início do século XVII e ser uma das razões para o envio da famosa expedição de Bento de Góis em 1603, e possivelmente um dos fatores que alimentaram ainda mais a lenda do mítico rei cristão do Oriente, "Prestes João".
Timur morreu em 1405 e seu filho Shah Rukh continuou a campanha contra os otomanos, criando esperanças no Ocidente cristão de que a maré turca seria desviada da Europa, porém sem sucesso. Após quase deixar de existir e passar por uma década de guerra civil num penoso Interregno, os efeitos de Timur passaram e os otomanos ressurgiram como a maior potência muçulmana global, infligindo duras derrotas no Ocidente cristão.
Mausoléu de Timur em Samarcanda, Uzbequistão | Wikimedia
Um aventureiro bávaro, Johann Schiltberger, é conhecido por permanecer a serviço de Timur de 1402 a 1405. Além disso, inúmeros comerciantes venezianos e genoveses estavam ativos em Sultaniya naquela época, desde o período do Ilcanato (1256-1355).
As próximas tentativas de amizade entre europeus e timuridas não conseguiram desenvolver-se muito mais adiante, embora o desejo de aproximação da Espanha com os mongóis tenha permanecido até a época de Cristóvão Colombo em 1492, cujo objetivo era alcançar o Grande Cã na China, ou achar o mítico Prestes João.